O aumento do crédito e queda de juros decorre também do aumento da garantia ao banqueiro
O crédito imobiliário tem superado recordes constantes. Segundo dados da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip), o crédito imobiliário com recursos da poupança atingiu R$ 2,27 bilhões em maio deste ano. O número de imóveis financiados alcançou 22.069, o mais elevado dos últimos 20 anos. O resultado de maio de 2008 supera em 57,8% o montante contratado no mesmo mês de 2007. No período de 12 meses, até maio de 2008 as novas operações cresceram 93,3% em comparação aos 12 meses anteriores, até maio de 2007.
Esse cenário tem sido creditado à queda dos juros, ao aumento dos prazos de financiamento e ao aquecimento da economia. Mas há uma questão que tem passado despercebida e que foi determinante para o aumento do crédito e a queda dos juros. Trata-se do fato de que os bancos e agentes financeiros passaram a utilizar a partir de 2003, como instrumento de garantia, a ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA no lugar da tradicional HIPOTECA. A Lei nº 9.514, de 20 de novembro de 1997, que instituiu a alienação fiduciária de bens imóveis e criou o Sistema de Financiamento Imobiliário (SFI), veio estabelecer uma nova modalidade de contrato que objetivou o aumento da garantia do credor e este passou a ter um poderoso instrumento para retomar o imóvel rapidamente do mutuário inadimplente.
DIFERENÇAS: ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA X HIPOTECA “TRADUZINDO O JURIDIQUÊS”
Na hipoteca o comprador torna-se mutuário e é mantido como proprietário do bem imóvel no Cartório de Registro Imobiliário, tendo o Agente Financeiro a garantia da hipoteca, que será executada caso ocorra impontualidade. Ocorre que, a execução da hipoteca, apesar do credor ter a preferência sobre qualquer outra dívida do devedor, demora em média de 3 a 7 anos, quando o mutuário toma a iniciativa de questionar o financiamento em juízo, o que evita que o credor penhore o imóvel e o leve a leilão para receber o saldo devedor. Assim, essa garantia não é tão eficaz devida à demora na solução do problema, pois, após leiloar o bem, o novo adquirente ou o Agente Financeiro tem ainda que promover o processo judicial de desocupação do imóvel. Com o longo prazo decorrido, é comum o devedor deixar uma elevada dívida com IPTU, taxa de condomínio, água e energia elétrica, conforme o caso, situação que agrava o risco do Agente Financeiro.
Na alienação fiduciária, o devedor, ao financiar o imóvel objeto da fidúcia, transfere a propriedade dele para o nome do credor, no caso, o Agente Financeiro/Fiduciário, que passa a figurar no Cartório de Registro de Imóveis como proprietário. O comprador torna-se Fiduciante, e assim, apenas permanece com a posse e o uso do imóvel enquanto mantiver sua pontualidade no pagamento das prestações. Já que alienou o bem a favor do banco, este devolverá a propriedade ao comprador somente depois deste pagar toda a dívida. Dessa forma, com a constituição da propriedade fiduciária, dá-se o desdobramento da posse, tornando-se o Fiduciante/comprador possuidor direto e o Fiduciário/Agente Financeiro, possuidor indireto do imóvel.
Pela nova modalidade de garantia, o credor imobiliário, dispondo agora da alienação fiduciária de bem imóvel, continua proprietário do mesmo, enquanto na hipoteca ele é simples credor de uma importância em dinheiro.
Quando o comprador pagar o total da dívida, o credor terá o prazo de 30 dias para comunicar o fato ao Registro de Imóveis para que o bem seja liberado da alienação fiduciária, sob pena de multa de 0,5% ao mês, ou fração sobre o valor do contrato.
RISCO DE PERDA DO IMÓVEL
A grande diferença entre a garantia hipotecária e a garantia da alienação fiduciária está em que, no caso de inadimplemento por parte do devedor/fiduciante, a execução da garantia será toda realizada extrajudicialmente e seguindo o procedimento previsto na Lei nº 9.514/97.
Caso o comprador atrase, por exemplo, três meses, o credor simplesmente solicita ao Oficial do Cartório de Registro de Imóveis que notifique, via correio ou pessoalmente, o devedor para quitar toda a dívida acumulada, com juros, correção e multa no prazo de 15 dias. Não sendo quitado, o Agente Financeiro simplesmente comparece à Prefeitura e quita o ITBI (Imposto de Transmissão de Bens Imóveis Inter Vivos) referente ao imóvel e assim consolida a propriedade em seu nome. Após promover o leilão público extrajudicial, já que o comprador perdeu a propriedade, este somente receberá alguma quantia de volta se o valor arrecadado no leilão superar o débito total do saldo devedor, acrescido das despesas do leilão. Outra diferença é que na alienação fiduciária a reintegração na posse e a desocupação do imóvel são deferidas liminarmente pelo Juiz, tendo o comprador 60 dias para desocupar, prazo esse muito curto em relação à hipoteca, que demora anos.
JUROS X GARANTIA
Os juros decorrem do risco. Assim, diante do aumento da garantia dos financiamentos imobiliários, que passaram a utilizar a alienação fiduciária a partir de 2003, surgiu um novo cenário que estimulou a queda dos juros, já que os Agentes Financeiros tiveram seu risco reduzido. Dessa forma, nada mais natural que aumentar os prazos, reduzir os juros e amenizar as exigências cadastrais dos pretendentes aos financiamentos imobiliários, pois, no caso de inadimplência, o imóvel é leiloado e o comprador é despejado em prazo inferior a um ano. Essa situação exige maior reflexão do pretendente ao financiamento sobre sua real capacidade de pagamento.
RISCO X JUROS
Os bancos oficiais (Banco do Brasil, Caixa, BNDES, Basa - Banco da Amazônia e BNB - Banco do Nordeste) ao serem questionados sobre os juros de 24% ao ano que cobram nos empréstimos, inclusive para trabalhadores, já que pagam apenas 6,25% ano aos recursos do Fundo de Amparo do Trabalhador (FAT), gerando assim lucros elevados que nenhum banco privado consegue, publicaram a seguinte explicação: “No cálculo do“spread”, revelado ao FAT, os bancos oficiais justificam que 43,3% dos juros cobrados equivalem ao “risco” do empréstimo.” Assim, vemos que os banqueiros estipulam o patamar de juros com base no “fato de risco”, sendo que este foi reduzido pela implantação da alienação fiduciária.
Portanto, cabe ao comprador, antes de assumir um financiamento que poderá chegar a 30 anos, analisar se sua renda ou emprego gerará recursos crescentes, sem interrupções durante décadas, pois a tendência é que os juros contratuais anuais (8,5% a 12,68%) acrescidos da TR e da taxa de seguro resultem num aumento da prestação e do saldo devedor em patamar superior aos reajustes salariais normais.
(*) O autor é Advogado especializado em Direito Imobiliário, Diretor da Caixa Imobiliária – Rede Netimóveis, Vice-presidente do SECOVI – Sindicato do Mercado Imobiliário
(Fonte: Diario das Leis)
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